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sábado, 20 de agosto de 2011

A NOSSA HISTÓRIA SUSPENSA POR CABO DE AÇO.

Em meados do Séc. XIX, tropeiros que descem a Serra do Doze descobrem que existem pedras que queimam e imigrantes italianos a partir de 1878 gritam que existem pedras que “brusam”. Eis o início de uma história feita de pedras e homens.

Em 20 de maio de 1874 visando a exploração do recém descoberto carvão, por decreto do Imperador D. Pedro II, nasce a chamada “Estrada do Visconde”, logo batizada de Estrada de Ferro Dona Teresa Cristina, em homenagem a nossa Imperatriz. Dois anos após com capital inglês transforma-se na “The Donna Thereza Christina Railway Company Limited. Em 1880, milhares de dormentes dão início à construção da estrada de Imbituba a Lauro Muller, numa extensão de 128 km, com um pequeno ramal que saúda Laguna, terra de Anita Garibaldi e sede do mais belo monumento em homenagem à mulher brasileira. O imigrante italiano transforma-se no braço forte deste empreendimento férreo que é inaugurado em 1 de setembro de 1884.

Em maio de 1917 é fundada a CCU – Companhia Carbonífera Urussanga e um ano após tem início a extração das primeiras vagonetas de carvão. Em 1919 a primeira Maria Fumaça chega à Benedetta, orgulhosa e faceira, chiando, ofegante e sedenta por um gole de vinho para temperar as suas engrenagens. Em 1922, ela avança sobre Rio Caeté e Rio Deserto em busca das pedras pretas.

Na linguagem do Monsenhor, homens e mulheres, mineiros e escolhedeiras, com saúde ou sem ela, trocaram os chapéus de palha pelos capacetes, os arados pelas picaretas, os carros de bois pelas vagonetes, o caldeirão da polenta pela marmita e começaram a registrar a história da Batalha do Carvão.

Um exército de colonos, motoristas, mulheres (e aqui vai uma homenagem às bravas mulheres escolhedeiras de carvão de Rio Carvão, Santana e Rio América, que com seu trabalho forjaram o futuro de seus filhos), além de mineiros, heróis anônimos de nossa terra, plantam uva, tomam vinho, comem polenta, arrancam do solo as pedras pretas e transportam o carvão por caçambas que voam rumo às caixas de embarque em Rio Deserto e no Bairro da Estação. Lá serão despejadas com enorme barulho nos vagões da E.F. Dona Tereza Cristina. Mineiros com seus gasômetros e picaretas escrevem o épico “A Saga do Carvão”. Quer queiram ou não, as pedras pretas fazem parte da nossa história, da nossa cultura, da nossa alma.

Imitando formigas em fila indiana, dia e noite e suspensas por cabos aéreos, cerca de 35 caçambas da CCU, com tecnologia da Siemens, num percurso de aproximadamente 3 km transportam carvão das minas de Rio América ao lavador e caixa de embarque em Rio Deserto.

Na década de 40, no Governo Getúlio Vargas, em plena II Guerra Mundial, o carvão torna-se fator de segurança nacional. Na década de 50, a CSN e a Carbonífera Treviso S/A deslocam a Marion I e II. Em 1952-1954, a MINERASIL- Mineração Geral do Brasil adquire cabos, torres e caçambas que chegam por navios e com tecnologia alemã dá início a construção do cabo aéreo Bairro da Estação – Rio Carvão – Santana. São 8 km, 50 torres e 140 caçambas com capacidade para 800 a 1000 kg de carvão. Em dois anos, o empreendimento está implantado. É inaugurado em 1956 e por 20 anos caçambas sobem e descem transportando algo em torno de 1 milhão de toneladas de carvão. As caçambas, tornam-se ao lado do vinho e da polenta, um dos mais tradicionais símbolos de nossa cidade.

Estamos vivendo a época dourada dos anos 60, da Jovem Guarda, dos The Beatles e dos Rolling Stones. A turma da Rua do Sapo, formada por, Gilson, Bita, Derde, Joca, Minossa, Pedrinho, Telmo, Baga, Capipa, Laudelino, Cal, Zé, Nazareno, Nico, Tadeu, Raul, Jânio, Keio, Loni, Sérgio, Lucafo, entre outros, passam o tempo atrás de uma “bola de pneu”, sobem o morro, chupam cana e bergamota e ficaram horas observando o vaivém das caçambas com o seu barulho característico que jamais sairão de seus ouvidos. De vez em quanto, alguém grita. Lá vem ela. É uma caçamba diferente que tem a missão de engraxar os cabos. Cabos arrebentados, caçambas paradas. Quando elas voltam a funcionar, o grito de alegria é geral. E o dia em que a caçamba tombou o caminhão do Otto Salvador? Foi assunto de nossa turma por dois anos seguidos. Era uma época de nossas vidas em que tínhamos ouro nas mãos e desgraçadamente não sabíamos.

A história é feita por pessoas. E o cabo aéreo tem a marca a ação de muitos homens como Dr Schmitt, João Méier, João Gabriel Maccari, o barbado, Otávio Zanin, Ângelo Zanin, Alberto Barrichello, Frederico Fernandes, Avelino Zanin, João Zanin, Ilbe Dal Bó, João Felisbino, Silvestre Bendo, Hortêncio Inocenti, Deoclerio Barbosa, Ângelo Zuchinalli, Valmor Concer, Remílio Covre, João Ramos Roussent, Joaquim Manoel, entre outros. Em 1977, as caçambas silenciaram. No início da década de 80 inicia-se o desmonte. Alberto Silveira, feitor da CCU, presenteia o mecânico Virginio Maestrelli com duas caçambas que foram guardadas a sete chaves.

Uma única voz se ergue, via sermões na Igreja Matriz e via Andorinha Mensageira, para que com o apoio do povo, as autoridades mantenham o cabo aéreo de pé no trecho compreendido entre a Vila São José e o Bairro da Estação. As autoridades se fizeram de surdas, e o povo indiferente. Monsenhor desiludido nos enviou uma correspondência a Pelotas onde cursávamos na Universidade a faculdade de Engenharia Agronômica e Direito, afirmando que “fora apenas uma voz que clamou no deserto. Não houve eco. Fui Derrotado”.

Urussanga cometia um dos maiores atentados culturais contra o seu patrimônio histórico.

Fonte: Sérgio Maestrelli

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